07/11/2024
A Assembleia Legislativa reuniu, na tarde desta quinta-feira (7), autoridades estaduais e municipais, além de membros da comunidade Linda Flor, em Assú, para discutir maneiras de impedir a criação de uma reserva ambiental na localidade. Proposta pela deputada estadual Terezinha Maia (PL), a audiência pública teve como objetivo gerar proposições que solucionem a referida pauta, que se relaciona tanto com a Economia quanto à área social e ao Meio Ambiente do Rio Grande do Norte.
“É com grande satisfação que damos início a esta audiência pública, a fim de discutirmos um tema tão importante para a região do Assú e para o RN: a criação da Reserva Ambiental da Comunidade Linda Flor. A reserva citada está localizada na Zona de Expansão Urbana de Assú. O projeto conta com cerca de 1000 hectares de extensão e ocupará uma área importante de fruticultura irrigada. Além disso, segundo moradores, caso a reserva seja implantada, a comunidade rural de Linda Flor ficará ilhada num anel de contenção, o qual impedirá o seu desenvolvimento, travando o crescimento da população”, iniciou Terezinha Maia.
Segundo a parlamentar, a questão afeta não apenas o desenvolvimento econômico do município, mas também a dignidade e o direito à terra de milhares de famílias da Comunidade Linda Flor.
“Estamos falando da expropriação de 784 hectares de terras produtivas, determinada pelo Governo do RN, através do Idema com o intuito de criar uma reserva florestal. De início, quero deixar claro que não estamos nos opondo à preservação ambiental. O que não queremos é que a comunidade seja penalizada pelos erros de um processo que já vem causando impactos ambientais há muito tempo, na Grande Natal e Região Metropolitana”, esclareceu a deputada.
De acordo com Terezinha Maia, as terras que o governo quer desapropriar cumprem sua função social, gerando empregos e garantindo a subsistência de mais de 6 mil famílias.
“O decreto estadual n° 33.657 não apenas compromete o sustento de famílias locais, mas também ameaça a segurança alimentar de toda a região, pois a comunidade rural abastece mercados, a exemplo da Ceasa - Natal e até de Campina Grande - PB. Retirar essas terras da produção agrícola, então, trará graves consequências, como desemprego, êxodo rural e aumento nos preços dos alimentos”, acrescentou.
A deputada disse ainda que as terras de Linda Flor fazem parte dos “raros 2% do Semiárido nordestino com potencial de irrigação”.
"Essa é uma dádiva para o desenvolvimento sustentável e uma oportunidade da qual não podemos simplesmente abrir mão. Estudos do IPEA e do Banco do Nordeste já demonstraram a importância dessas terras para a Agricultura do Estado. Ignorar esses dados seria um erro administrativo e - mais ainda - uma injustiça social. Estamos dialogando com a Prefeitura de Assú e soubemos que, em setembro, após reuniões com a Fecomércio e a Associação Assú Futuro, o Idema iniciou o mapeamento das áreas de produção. Esperamos que esse seja o passo rumo a uma solução mais justa e razoável”, ressaltou.
Por fim, Terezinha Maia afirmou que levará essa luta adiante e pressionará o Governo do Estado em busca de alternativas.
“A preservação ambiental deve ser uma causa de todos nós, mas nunca às custas da vida e da dignidade de famílias trabalhadoras. Que possamos buscar áreas que realmente precisam de reflorestamento e recuperação, sem sacrificar comunidades produtivas que já contribuem para o desenvolvimento do Estado. Contem com o meu apoio e lembrem que eu sempre estarei ao lado dos trabalhadores e trabalhadoras de Assú!”, concluiu a parlamentar.
Em seguida, o presidente da Associação Assú Futuro, Janaelson Galvão, abordou a visão dos produtores e trabalhadores rurais da região.
“Nós estamos aqui hoje para tratar de uma questão urgente que ameaça diretamente o futuro das famílias do distrito rural Linda Flor, no município de Assú. Falo em nome dos agricultores, trabalhadores e lideranças comunitárias que vivem e dependem dessas terras, que há gerações são fonte de sustento, de identidade e de trabalho digno da região. A decisão do Idema em desapropriar terras produtivas de Linda Flor para compensação ambiental levanta sérios questionamentos quanto à sua real necessidade e impacto”, destacou.
Segundo o representante da associação, “as terras do distrito rural não apenas produzem alimentos que abastecem o município de Assú e o Estado, como também sustentam economicamente centenas de famílias que dedicam suas vidas e trabalho árduo à agricultura”.
“A desapropriação coloca em risco imediato essas famílias, ameaçando seu sustento e dignidade, além da estabilidade social de toda a comunidade. Os reflexos econômicos são outro fator a ser considerado. Linda Flor é de grande importância para a economia de Assú. Portanto, a retirada da comunidade sem a compensação adequada representa uma perda direta de renda para as famílias locais, mas também compromete a cadeia produtiva regional, impactando o Estado como um todo”, alertou.
Já o presidente dos Produtores Rurais do Vale do Açu, Tiago Bezerra, relatou o sentimento que os produtores tiveram ao tomarem conhecimento do decreto.
“Quando soubemos do decreto, ficamos muito apreensivos. As nossas áreas são altamente produtivas. Se formos analisar, em termos de Brasil, apenas 2% do Semiárido é passível de irrigação. São áreas extremamente férteis e com água em abundância. E é o nosso caso em Linda Flor. Lá nós temos 200 pessoas trabalhando diretamente no campo, com alta produtividade, abastecendo o RN, o Nordeste e indo até Goiás. Então, hoje a gente vive um clima de ansiedade e angústia, sem saber se investe mais, se contrata mais pessoas, se demite algumas. Enquanto a gente não tiver essa resolutividade, vamos viver esse pesadelo. A gente não vai conseguir deitar a cabeça no travesseiro e dormir tranquilo, sabendo que tem 100 funcionários que podem ser demitidos, porque o decreto pode nos expulsar da nossa propriedade”, desabafou.
Concluindo, ele destacou que o intuito com a audiência é pedir o apoio dos deputados e sensibilizar as autoridades, pois eles sabem que há áreas ociosas no Estado que podem ser utilizadas para o fim de reserva florestal.
Na sequência, o deputado estadual Nelter Queiroz (PSDB) classificou como “injustificável” a atitude do governo estadual.
“E eu desconfio que o interesse do governo é entregar essas terras para as ONGs. Isso é o que passa pela cabeça de algumas pessoas com quem conversei. O que está faltando nesse País é emprego. E como se justifica tirar os trabalhadores que produzem em Linda Flor para criar uma reserva ambiental que não é obrigada a ser ali?”, questionou.
De acordo com o parlamentar, o Governo do Estado tem obrigação de encontrar uma terra para cumprir decisão judicial, mas não uma terra produtiva.
“A governadora precisa se posicionar. Precisamos de uma mesa redonda com o prefeito, a população e os produtores, para que possamos acabar com essa angústia. Mas eu acredito que a governadora Fátima não vai deixar isso acontecer com os produtores de Assú. Porém, se vocês precisarem, podem contar com o meu mandato”, garantiu o deputado.
O secretário estadual de Agricultura, Pecuária e Pesca, Guilherme Saldanha, afirmou que a medida “não é coisa do Governo Fátima”.
“Isso foi uma demanda antiga, que se transformou em decisão judicial, dos vários trabalhos que o governo, em execução de obra, não fez a compensação ambiental. Daí, o Ministério Público cobrou e a letra da lei não pode ser contestada, tem que ser cumprida. Depois disso, houve a necessidade de se encontrar uma área para se fazer a compensação ambiental”, explicou.
Sobre a escolha da área, o secretário concordou que “não foi adequada”. “Então, é preciso sentar à mesa para encontrar soluções. E eu digo, sem medo de errar, pelo que eu conheço da governadora, da sua capacidade de ouvir e cobrar de nós, secretários: isso pode ser revertido”, complementou.
Ao final da sua fala, ele garantiu que iria encontrar uma solução para o problema, juntamente com o chefe da Casa Civil, o Ministério Público (MP) e a Justiça.
Representante do deputado federal Benes Leocádio, o ex-prefeito Ivan Júnior externou a preocupação do parlamentar quanto à questão.
“Essa desapropriação vai inviabilizar a vida de muitos agricultores, não somente de Linda Flor, mas também das suas vizinhanças, como Santo Antônio e Santa Clara. Se esse projeto avançar, o emprego de quem produz será retirado, a fim de arrecadar para o Estado. Mas todas as áreas são produtivas. Isso está sendo discutido desde 2023, e o que os produtores querem é que essa área seja descartada o mais rápido possível, pois seria inviabilizado um setor bastante produtivo, áreas riquíssimas, que geram emprego e renda para a região”, enfatizou.
Continuando os discursos da mesa, o diretor técnico do IDEMA (Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente), Jonielson Oliveira, explicou que a referida demanda judicial existe há décadas.
“E, em 19 de março deste ano, na nossa audiência com o MP e o Judiciário, não foi dada ao Idema a oportunidade de fazer novos estudos ou de procurar novas áreas. Apenas nos foi determinada a obrigação de publicarmos o decreto de desapropriação no prazo de 30 dias, sob pena de multas de 50 mil reais ao Idema e de 1 mil reais por dia ao diretor-geral”, detalhou.
Segundo o diretor técnico, no mesmo dia da publicação do decreto, o órgão recebeu a visita de um representante de uma suposta produtora, informando que participou da audiência como ouvinte e confirmando o interesse na desapropriação.
“E isso nos levou a crer que a desapropriação não traria esses infelizes impactos. Mas, depois de um tempo, começaram a chegar as informações do impacto da medida às pessoas, e isso nos preocupou muito, porque o Idema, apesar de ser uma autarquia do Meio Ambiente, também tem dever com o desenvolvimento sustentável.
O representante do Idema afirmou ainda que estava assimilando todos os tópicos expostos na audiência, principalmente o que poderia prejudicar a comunidade e aqueles que trabalham e geram sustento e emprego.
“E eu garanto a vocês que nós buscaremos uma forma de negociar a oportunidade de buscar novas áreas, com novos prazos”, disse, ressaltando que isso não dependeria exclusivamente do Idema.
“Porém, como estamos tratando de uma demanda judicial, cujo autor da ação é o MP, cabe também a ele ter a sensibilidade social para oportunizar o Idema a buscar alternativas de cumprir essa reposição florestal”, concluiu.
Para o presidente da Faern (Federação da Agricultura e Pecuária do RN), José Vieira, não é mais surpresa esse tipo de coisa acontecer com relação ao Vale do Açu.
“Um tempo atrás queriam inviabilizar 9.000 hectares no Vale do Açu, sem nenhuma comunicação com a sociedade. Depois, tivemos o aumento da reserva FLONA para 5.000 hectares, com o mesmo objetivo. É muito estranho que o governo queira desapropriar uma terra, para fazer uma reposição florestal das mais caras do Estado, enquanto tem as fazendas da Emparn, vários assentamentos e várias áreas degradadas. Mas eu não tenho dúvidas de que, quando o juiz vir o mapa da desapropriação com uma comunidade no centro, ele irá refazer a decisão”, disse, em tom positivo.
Em seguida, o deputado Coronel Azevedo (PL) falou que “é um absurdo o Governo do Estado querer desapropriar uma das poucas terras produtivas do Rio Grande do Norte”.
“Nós estamos inseridos no semiárido nordestino, e aqui é muito difícil produzir. É baixíssimo o percentual de terras produtivas no RN. Tanta coisa para se fazer a fim de salvar o Meio Ambiente, e o governo mira justamente no Vale do Açu. A medida tira a possibilidade de desenvolvimento socioeconômico do RN. Vai causar desemprego, pobreza, êxodo rural e muitos outros problemas”, criticou o parlamentar.
Segundo o prefeito de Assú, Gustavo Soares, o assunto diz respeito a uma cidade em pleno desenvolvimento, fala de vidas, de pessoas, de propriedades e famílias que estão sendo usurpadas do seu direito legítimo à propriedade.
“Nós temos dois grandes eixos para combater o problema: um é Jurídico, através do qual temos que sensibilizar pessoas que não saem dos seus gabinetes. Para isso, nós precisamos juntar elementos que nos respaldam, a fim de combater a medida legalmente. Na segunda vertente, nós podemos usar o ambiente legislativo ou governamental, sensibilizando-os e mostrando como é para cada assuense ver a sua propriedade ser usurpada”, detalhou.
O atual gestor municipal disse, em seguida, que já teve uma conversa com a governadora Fátima sobre o assunto, pouco antes das últimas eleições.
“Ela se sensibilizou e, ao mesmo tempo, falou que não é interesse do Estado permanecer com esse projeto. Mas nós sabemos que existe a questão legal. Por isso, precisamos ir aos órgãos jurídicos e mostrar os elementos necessários para comprovar a nossa produtividade. Então, enquanto prefeito e assuense, saibam que vocês podem contar comigo na luta contra esse projeto, até porque existem áreas suficientes para que ele continue de uma forma muito mais barata para o Estado, deixando nossa região em paz”, finalizou.
Ao final do debate, a deputada Terezinha Maia elencou os seguintes encaminhamentos: agendar reunião com a governadora, Procuradoria Geral do Estado, Justiça e Ministério Público, a fim de apresentar soluções para rever áreas de reservas ambientais, bem como rever o decreto de delimitação da área de Linda Flor; agendar reunião com a Promotoria, com o objetivo de mostrar a situação de Linda Flor, apresentando o relatório desta audiência; encaminhar ao IDEMA o resultado desta audiência, para que o órgão tome conhecimento do real problema e se sensibilize com o apelo popular; propor um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) para troca da demarcação da área de proteção ambiental; e formar um grupo para realizar estudo técnico, a fim de apresentar alternativas de implementação de reservas ambientais em outros locais, com terras improdutivas.
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